Você deve estar se perguntando como deve ter sido a vida logo que chegamos aqui né. Pois vou contar hoje com a memória de uma criança, como vivíamos logo que chegamos. Quando você faz a decisão de largar seu País, acredito que na cabeça deve passar muitas coisas. Digo no caso dos adultos. Eu falo mais pelo meu pai, e meus tios que não são descendentes. Admiro muito a coragem deles.
Desculpe a falta de qualidade dessas fotos, mas realmente é um milagre ter essas fotos ainda. Da esquerda pra direita meu pai, meu tio Milton e meu tio Moreira. Nossos super heróis.
Não fomos nem de longe os primeiros a chegar aqui. Nós já tínhamos familiares aqui no Japão quando chegamos. Porém eles moravam em outro estado. Mas acredito que pra esses homens que não sabiam o que esperar de um País como o Japão, eles foram bem ciganos.
Nossa aventura começou assim que chegamos aqui. O maior dos desafios, a comida. Eu sempre amei o misoshiru da minha batyan, o onigiri salgadinho. Mas nunca gostei de comida doce. E ali me deparei com esse grande problema. O senhor da empreiteira do meu pai trouxe pra todos uma comida bem Festiva e japonesa.
Hoje eu sei que ele estava tentando de tudo pra agradar a todos. Mas naquela época me pareceu bastante desrespeitoso ele trazer arroz com feijão doce pra comer. O cheiro já me causava um grande desconforto no estômago. Imagine pro meu pai e meus tios. Minha mãe sempre foi bem centrífuga, não lembro das minhas tias. Mas acredito que todas comeram aquele arroz com feijão doce. Eu não. Até hoje é um mistério pra mim como eu sobrevivi aqueles dias.
Sobre o arroz com feijão doce, ele é servido em ocasiões especiais aqui no Japão. Geralmente em dias festivos, e em alguns casos em funerais. Aquele senhor tinha muita boa intensão. Mas como diz o ditado, de boa intensão o inferno está cheio.
Até onde eu sei o serviço que ele arrumou pro meu pai e meu tios era um serviço de matar. Era algo de concreto bem gigante. Não sei dizer ao certo o que era. Mas esse foi o motivo de minha família migrar pra outro estado mais tarde.
Nosso apartamento tinha dois andares. O primeiro um era da minha mãe e minha tia Maria. E outro da minha tia Marcia e minha tia Mada. Como podem ver cada apartamento moravam duas famílias.
Logo ao entrar, tinha que tirar os sapatos. Aqui no Japão você não vai ver casa que entra de sapatos. Os sapatos sempre ficarão na entrada.
Até quando voltei a morar no Brasil muitos anos depois, adotei esse hábito. É muito mais higiênico. A diferença é que no Brasil não tem essa separação da entrada, onde pode deixar os sapatos. Eu fazia minhas visitas deixar na porta mesmo.
Logo ao entrar na nossa casa, ficava a cozinha. Era fogão, geladeira, e pia. Bem simples. Não tínhamos mesa com cadeiras para sentar. Sentávamos no chão mesmo.
Nessa foto não estão todos. Foi difícil achar fotos dessa casa. Mas queria postar pra que possam ter uma ideia da nossa mesa.
A casa só tinha dois quartos. No caso seria um sala e um quarto. Pra todos. Cada cômodo ficava com uma família. Tinha o banheiro, e o ofurô. Tudo ali era bem agradável até um dia que pulou uma tarântula da janela.
No Japão as janelas sempre vinham com uma proteção. Geralmente as pessoas fecham essa proteção no horário de dormir. ( até hoje não entendo muito bem o propósito disso, já que não é um país perigoso). As janelas antigas, tinham essa caixa de madeira por fora para guardar essa proteção. E foi dali que aquele demônio pulou pra dentro de casa.
Não me lembro como ela saiu. Mas acredito que não saiu viva. Mais tarde ia descobrir que tinha bicho bem pior que ela. Que Deus a tenha.
Como boas crianças, tudo era brincadeira. Não tínhamos brinquedos. Mas tínhamos redes de pesca, corríamos atrás de borboletas com ela, ou pescávamos peixinhos no esgoto de frente de casa. É…. Você leu isso mesmo. Além do laguinho que tinha perto de casa, tinha um esgoto. E não sei o que víamos de tão interessante ali. Mas ficávamos sempre naquele lugar. Tanto que todos tem histórias de ter caído dentro dele. Menos eu. Hahahahahaha …..
A hora de tomar banho era sempre divertido. Lembro que as crianças tomavambanho todos juntos. Era uma comédia ! Certo dia estávamos ali dentro da banheira, eu era a mais velha, e percebi que havia algo boiando ali dentro. Rapidamente identifiquei e caí fora. Hahahahaha depois que estava fora, dei um grito; “ ela cagou ! “ hahahahhahhahhaa imagina o desespero do meu primo e meu irmão ! Hahahahahah até hoje não esqueço a rapidez deles em sair daquela banheira. Minha prima de um ano achou interessante temperar aquele banho. Ela era uma comédia !
E assim eram nosso dias. Ah eu falei que não tínhamos cama ?! Sim, aqui no Japão era bem normal dormir no chão. Até hoje acredito que ainda tem gente que dorme. Existem esses hotéis estilo japonês, chamados de ryokan. Ali as pessoas dormem no chão, e a comida é servida numa mesa baixa e todos comem sentados no chão. E não é porque dorme no chão que é barato Ta. O valor não muda por isso. Dormir no chão não é sinônimo de pobreza aqui. É cultural mesmo. E nas casas japonesas naquela época dormiam todos juntos. Um do lado do outro.
O divertido de dormir assim, é que parece que estamos sempre em festa. Lembro que na casa da minha batyan fim de ano era bem assim. Cada canto tinha um jogado no chão. Era muita gente. E era muito legal. Sempre amei essa festança toda. A casa cheia, a família rindo o tempo todo presentes e a mesa farta. Não tem preço tudo isso né. E quando chegamos aqui, essa união continuou. Com metade da família, ainda continua. E faço questão de reunir todos nos feriados. Exceto esses anos de corona. O que quebrou nosso barato. Bom, contei o básico de como era logo que chegamos. Ainda tem muitas coisas pra contar. Então vou guardar pro próximo episódio….. Obrigada por acompanhar até aqui. Espero que gostem e reviva comigo essa época. Foi uma fase bem legal da minha família. Que tenho tanto
Orgulho até hoje !!
